Páginas

domingo, 31 de julho de 2011

359 - AS MUITAS AMY WINEHOUSE

"(...) todos os anônimos e famosos que se enveredaram e enveredam pelo estreito caminho do alcoolismo e das drogas jogam Xadrez com a morte sem qualquer noção do jogo."

"Pessoas loucas como eu não vivem muito, mas vivem como querem!"
                                                                                                       Amy Winehouse
A morte da cantora inglesa Amy Winehouse no sábado passado desencadeou uma série de matérias em jornais, sites e TVs do mundo inteiro. Todas elas praticamente trouxeram a mesma abordagem, uma vez que, assim como o reconhecimento pelo seu trabalho musical era quase uma unanimidade, era pública a decadência da sua vida pessoal.

Amy e todas as pessoas que, como ela, mergulham no submundo do álcool e das drogas assinam uma espécie de termo de ciência da própria tragédia anunciada. O que muda é apenas o histórico de cada um, as suas dores, traumas e motivações para essa viagem com passagem só de ida.

Não há qualquer poesia na morte prematura de artistas famosos e talentosos como a cantora inglesa. A sua partida trouxe à tona a enigmática "morte aos 27 anos", que também levou outros ícones da música, como Janis Joplin, Jimi Hendrix, Jim Morrison e Kurt Cobain. Todos eles poderiam perfeitamente ter chegado a um momento ainda mais maduro de suas carreiras, como tão bem o fez o beatle Paul McCartney.

Fato é que todos os dias, nos quatro cantos do planeta, jovens como Amy Winehouse morrem em consequência do alcoolismo e do vício nas drogas. Estes anônimos, no entanto, não vão deixar para a história CDs e DVDs gravados; músicas que serão cantadas e regravadas décadas depois; biografias póstumas e milhares de reportagens especiais. Eles, se muito, terão um túmulo com nomes e datas de nascimento e morte, já que tantos se vão como moradores de rua, a serem sepultados em valas comuns.

Como na história de um dos clássicos do cinema mundial - "O Sétimo Selo", todos os anônimos e famosos que se enveredaram e enveredam pelo estreito caminho do alcoolismo e das drogas jogam Xadrez com a morte sem qualquer noção do jogo. Para quem não conhece essa obra do diretor sueco Ingmar Bergman, lançada em 1957, ela conta a história de Antonius Block, um cavaleiro medieval que regressa das Cruzadas e se vê diante da sentença que, através da peste negra, praticamente condena ao fim a Europa do século 14.

Ceifado de esperança e de fé, Antonius encontra no caminho de volta para casa um carrasco implacável: a morte. Personificada em um homem de manto e capuz negros, ela deixa claro para o cavaleiro moribundo que o seu destino não será diferente dos demais. O pobre humano, tomado por uma centelha de amor à própria vida, propõe um último e decisivo jogo de Xadrez com o seu algoz. Como suas duas únicas exigências, o cavaleiro propõe uma trégua enquanto o jogo durar e, em caso de sua vitória, a morte deve deixá-lo em paz.

A humanidade tem sido tomada por angústias sutis e escancaradas que, aos poucos, vai dissolvendo e consumindo os seus mais nobres propósitos. O álcool e as drogas são alguns de seus ingredientes mais corrosivos.

Ao escolher o Xadrez como a forma da sua personagem desafiar "alguém" tão poderoso, Ingmar Bergman usa o jogo como um símbolo da razão, da luz capaz de organizar as ideias e dar um sentido à vida. Amy Winehouse e todos os que se foram como ela deram as costas à razão; arriscaram todas as suas fichas na roleta russa - um jogo que, ao contrário do Xadrez, requer apenas espírito de aventura, emoção a flor da pele e muita sorte.Roberto Darte

Enviado por Roberto Darte em 29/07/2011
http://www.recantodasletras.com.br/artigos/3126110
 
Código do texto: T3126110
Esta obra está licenciada sob uma Licença Creative Commons. Você pode copiar, distribuir, exibir, executar, desde que seja dado crédito ao autor original. Você não pode fazer uso comercial desta obra. Você não pode criar obras derivadas

Nenhum comentário: